domingo, 30 de agosto de 2009

Caminha

Nasceu mais um potro na ilha dos Amores, mas a loura "Shakira" parideira já não anda por lá...
Continuam a saber melhor ali as sardinhas assadas a escorrer no pão, a massa com feijão feita na hora e o café que levamos na garrafa térmica...
Até mesmo o café em baldes como o que nos servem quando optamos pela escapadela a uma das esplanadas da margem espanhola, com segundas intenções: beber a fresquinha aguardente de hierbas!
Já a água daquela foz continua quente, teimosamente mais quente do que no mar ali ao lado...
Eu também teimo em não saber domar as correntes, nem o vento, mas sinto-me mais ao leme, mesmo que às vezes ainda me sinta a mais ao leme!
Cerveira terá sempre a melhor feira e a surpresa dos achados urbanos, legados da bienal.
Em Caminha elejo a praça, dos pequenos almoços preguiçosos, entre jornais e revistas,
e dos cafés digestivos nas noites amenas de Agosto...
A Rua Direita continua a mesma, mas eu sou menos a mesma.
No que continua, ainda bem que continuam os jantares em que todos nos reencontramos, ou quase todos... Este ano faltaram Alguns...
Mas é o reencontro o que mais gosto em Caminha: gosto desse conforto de vos ter por perto, gosto desse quentinho que sinto neste cantinho.

lunes, 24 de agosto de 2009

Par delá les nuages

Há uns anos vi no saudoso Cinecentro da Covilhã um filme (o último) do Antonioni, que tinha este título fantástico "Par-delá les nuages" - para além das nuvens... E é de nuvens que é feito o céu que observo sobre o Monte de Santa Tecla do outro lado do rio Minho. Algumas cortam mesmo o monte a meio e as mais atrevidas pousam no rio e confundem-se com ele, como se quisessem resgatar-lhe a água, que se escapa em vapor...

E as nuvens, em dias de férias, deixam-me melancólica e sonolenta, com vontade de evaporar. Fugiria bem para lá das nuvens.

domingo, 16 de agosto de 2009

O silêncio

"A coisa mais difícil e mais bonita de partilhar entre duas pessoas é o silêncio."

A penúltima vez que li um livro sem intervalo foi o "Cartas a Sandra" do Virgílio Ferreira e a última foi ontem à noite, o "No teu deserto" do Miguel Sousa Tavares.
Nestas coisas talvez o tamanho importe, já que ambos têm pouco mais de 100 páginas, mas a razão pela qual em nenhum momento consegui adiar a leitura das páginas seguintes foi porque conversas daquelas não queremos deixar a meio... E se na realidade o fazemos, generosos com a angústia, vingamo-nos na ficção, na verdade dos outros!
E com isto chego à conclusão nada inédita de que a arte serve para isso mesmo, para dizer a verdade que calamos na vida de todos os dias... por isso nos emociona, por isso nos identificamos! Vai daí que a arte não imita a vida coisa nenhuma, supera-a quase sempre! Ou pelo menos sempre que justifica esse nome!

A vida anda demasiado preenchida com banalidades... ou como escreve o Miguel, as pessoas, "em vez do silêncio, falam sem cessar; em vez de se encontrarem, contactam-se, para não perder tempo; em vez de se descobrirem, expõem-se logo por inteiro... Muito embora julguem poder ter o mundo aos pés, não aguentam nem um dia de solidão. Eis porque já não há ninguém para atravessar o deserto. Ninguém capaz de enfrentar toda aquela solidão. "

Às vezes não entendemos logo porquê, mas o cérebro faz curiosas associações... e o meu foi buscar agora o "Few of us" do Sharunas Bartas. Eu tenho o desolador hábito de me esquecer até dos filmes de que gostei..., mas deste não me esqueço, de tal maneira me atingiu aquele silêncio... de tal forma gostei daquela partilha, de perceber o tanto que o silêncio pode dizer. O Paulo Branco, que o produziu, aconselhou a certa altura que se escrevesse pouco sobre o filme, já que "está para lá das palavras!"
Eu desobedeço-lhe com medo de que a memória me traia...

jueves, 13 de agosto de 2009

Par hasard

Gostei sempre desta expressão, mais do que de "por acaso"... "Par hasard" parece fazer mais a vontade ao acaso... E em Paris era de prever que a expressão ganhasse em poesia, mas no "Paris" de Cédric Kaplish, a vitória é mesmo do acaso, da metafísica, do que não dominamos, do que não depende de nós... Como o acaso contracena connosco sem pedir licença, sem ensaio prévio, roubando-nos tantas vezes a cena, interferindo na nossa história, tomando-lhe o pulso...
Par hasard um coração ameaça deixar de bater, par hasard há um que pára mesmo, par hasard naquela fila senta-se a tal, par hasard todos os nossos colegas morreram ao atravessar o Mediterrâneo, mas nós ficamos para viver a história, par hasard a filha do vendedor de fruta é a melhor amiga da nossa filha e nós ainda não sabemos, mas esses acasos vão mudar a nossa vida!

Paris é mais do que cenário nesta história, tal como Barcelona na "Residência espanhola", ou Londres, Moscovo, São Peterburgo e de novo Paris em "As bonecas russas". Cédric filma as vidas que se vivem nas cidades, mais ou menos influenciadas pelo acaso de terem ser sido aquelas e não outras cidades!

lunes, 10 de agosto de 2009

Porque SIM!

Demasiadas vezes ouvi pessoas de quem gosto dizerem: "já cá não estou a fazer nada!", ou "não tenho alegria na vida!"
Nenhuma delas estava condenada à imobilidade, nem à dor física para o resto da vida... e, por isso, não entendi este desapego à vida... que muitas vezes cataloguei de ingratidão, ainda que sem o verbalizar.
O melhor será não ter que o entender nunca...

Por isso me merece especial respeito um Senhor que nos pediu para sermos felizes e que sugeriu para seu próprio epitáfio esta saída deliciosa: "Aqui jaz Raúl Solnado, mas contra a sua vontade!"
Espero que lhe tenham feito a vontade...!

jueves, 6 de agosto de 2009

Ler... a mente

"O que faria você no meu lugar?

Esta é a frase que eu não esquecerei do filme "The reader", que vi só esta semana.
É consensual condenar o nazismo e todos os que para ele contribuíram. É consensual e fácil... Eu também condeno.
Mais difícil é tentar responder a esta pergunta. E se fosse eu, o que faria? Não sabemos como e estamos a fazer uma coisa com a qual não concordamos e depois tentamos fazê-la da melhor maneira... A intenção, a motivação de cada um pesa e muito na hora de julgar o acto.
Condenamos tantas vezes coisas com a facilidade de quem não passou por lá...

Eu gosto de pensar que, em última análise, temos sempre escolha. E temos.
Mas também me parece importante saber que circunstâncias condicionam a escolha e não nos limitarmos ao "de boas intenções está o inferno cheio".

Resumindo: o filme vale a pena, nem que seja por convocar esta discussão...

Intervalo

Entro no elevador vazio e enquanto as portas se fecham atrás de mim desejo que ninguém me interrompa a descida.... Fico comigo do outro lado do espelho. Preciso daqueles segundos de clausura para poder não fingir...
As portas abrem-se, lentamente, deixando-me reencarnar o meu papel...
A vida prossegue.

A caminho dos correios, passo ao lado da maternidade, onde escuto a boa notícia dada por telemóvel: "A Madalena já nasceu!"

lunes, 3 de agosto de 2009

Também tu?

"Razões não me faltam para partir ou para ficar - falta-me seguramente a vontade, a convicção, algo mais forte e profundo. Ou apenas o reconhecimento de pequenos nadas que fazem toda a diferença."

Lido agora mesmo no blog do Pedro Rolo Duarte