viernes, 18 de noviembre de 2011

O fado do nosso património

Nesta porta mora talvez a casa onde o fado acontece de forma mais autêntica. (Obrigada Jaume por me falares da Mesa de Frades).




Diz-se que o restaurante, onde agora se escutam os poetas, as guitarras, as violas e os brindes a tudo isso, terá (quem sabe) escutado outrora as preces de uma certa Dona Rosa, alegada amante de D. José I. É que a porta que hoje se abre para o fado, abria antes para uma capela... E esta é a única porta que abre deste edifício quinhentista, o palácio da Dona Rosa... Decadente, esventrado (o gradeamento foi insuficiente para deter os caçadores de azulejos históricos)... Triste fado, o do património, em Lisboa.



Alfama é isto: FADO, Santos Populares e um património urbanistico fantástico, lamentavelmente, em decadência.


Para nossa sorte o FADO é imaterial e deverá a UNESCO considerá-lo, em breve, Património da Humanidade.

lunes, 14 de noviembre de 2011

"Paris em Lisboa"

Se as estações do ano fizessem testes psicotécnicos para saber para o que têm jeito, ao Outono daria certamente “artes”… já as outras não sei e não vou agora reflectir sobre isso.
Mas agradeço ao Outono por esse talento, por tornar crepitantes todos os passeios calcetados que levam à Gulbenkian, por pintá-los com as cores, que, misturadas, se tornam nas minhas preferidas... Como pode esta Natureza morta ter tanta vida?


E serve este projecto de prólogo para introduzir o tema "A Perspectiva das Coisas. A Natureza-morta na Europa", a exposição que visitei na Gulbenkian... As naturezas-mortas de Cézanne, Renoir, Monet, Vieira da Silva, Amadeo de Souza Cardoso, Picasso, Braque, Dalí, Magritte, Matisse, Gaugin, … e o que mais me comove e mais me espevita: Van Gogh! Companhias raramente disponíveis a um sábado à tarde, em Lisboa. E eu tinha saudades deles, do que me fizeram sentir repetidas vezes, em Paris, em Madrid, em Barcelona, em Amsterdão, em Antuérpia, em Londres...

... Sobretudo aos franceses, invejei-os, por terem abarbatado tanto talento naquele período mágico dos “ismos”… Mas no dia em que passei pelos mesmos "ismos" na Gulbenkian, o que senti foi gratidão pelo Sr. Calouste (o outro ministério da cultura). Em primeiro lugar, porque me destruiu um preconceito: é que achava que não gostava especialmente de naturezas-mortas na pintura. Achei uma seca ter que pintar pêssegos nas aulas de pintura, mas foi da trabalheira que me deu representar a pele aveludada e de mil cores desses pêssegos que me lembrei quando os vi num dos quadros em exposição (já não me lembro de que pintor). E também quando descobri o minúsculo quadro com meia dúzia de maças, de Cézanne. O Cézanne que me deixou KO, quando o conheci melhor na exposição "De Cézanne a Picasso", no Museu d' Orsay, que reunia várias obras de pintores representados pelo visionário marchand Ambroise Vollard (alguém que gostaria de ter entrevistado para indagar sobre o seu talento maior, o de descobrir génios)...


Voltando à Gulbenkian, além de descobrir que os girassóis também posaram para Monet, de me dar conta (com a ajuda do professor Rui Mário e do Câmara Clara) que Van Gogh pode ter estado deprimido, mas é de alegria e de Vida que falam as suas pinceladas enérgicas, descobri também um pintor novo (para mim): o Juan Gris. O quadro acima foi um dos que mais gostei. Gostei do brinde, da sugestão de olhar para fora do nosso casulo, aceitar o convite do vento, sem perder de vista o cume,... um cume.

E tudo isto é desarmante, porque em vez de inspirar, a mim desencoraja: para quê pintar, se eles já atinjiram o céu? Como chegar Lá? Como chegar-lhes sequer aos calcanhares? ...porque para Lá chegar é preciso mais do que talento, tem que haver uma pulsão, uma Pulsão Maior.

lunes, 7 de noviembre de 2011

"Química"

LÁGRIMA DE PRETA
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterlizado.
Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
nem sinais de negro
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.

António Gedeão (Rómulo de Carvalho, que para este poema não precisou do curso de Ciências Físico-Químicas, que tinha, para nada).

Isto porque gosto especialmente do fácil que é entender o quão estúpido é qualquer sentimento racista através deste poema, que troca as voltas ao preconceito, com uma prova científica... e porque hoje, no 144º aniversário da química Marie Curie, no Sociedade Civil, se aludiu "à química que há entre nós"...