martes, 29 de junio de 2010

Maradona e Kusturika


Maradona reconhece que é um actor, paradoxalmente não porque finja, mas porque vive. Responde assim a Kusturika no documentário que este realizador sérvio fez sobre o jogador argentino, que é também um documentário sobre ele próprio e sobre o seu olhar, sobre o seu cinema... Uma crítica que li na altura em que saíu o documentário mal dizia disso mesmo, de haver demasiado Kusturika no documentário sobre Maradona. A mim, pelo contrário, agrada-me. Nessa presença e identificação está a justificação do documentário: Kusturika admira o que é admirável em Maradona, a sua capacidade de renascer, de acreditar, de fazer os outros acreditarem, o seu sentido de justiça (ainda que possamos não estar de acordo com os pesos que ele coloca na balança) e o facto de pôr o coração e o sonho antes da razão, o facto de lhe importar mais do que o dinheiro... Não há como mostrar estas características sem as admirar.

Maradona é o jogador que perdeu para a cocaína, mas é também o homem que optou pelo Boca em detrimento de uma proposta mais choruda do Riverplat, para cumprir um sonho, é o homem que se recusou a conhecer Carlos de Inglaterra porque não tem memória curta, que marcou um golo (validado) com a mão à mesma Inglaterra no mundial de 86, no México, e chamou-lhe justiça (la mano de Dio), para vingar as Malvinas, que a Argentina perdeu para Inglaterra numa guerra quatro anos antes.

Por ter perdido a guerra, caíu a ditadura na Argentina e restaurou-se a democracia, mas isso parece não importar a Maradona, que se diz capaz de morrer por Fidel e revela ancorar nos escritos de Che Guevara as suas convicções políticas. Aqui também se deduz a cumplicidade existente entre o realizador e o jogador. E é aqui que eu deixo de entender a América do Sul, esta América do Sul que venera o comunismo... talvez quando a visitar perceba mesmo sem concordar... Talvez se eu fora Maradona

É estranho que da primeira vez que aqui coloque um trailer de um filme de Emir Kusturika seja sobre Maradona. É estranho porque deveria ser antes sobre o Underground, que é um dos filmes de que mais gostei na vida (e o na vida aqui fica bem) e o meu preferido deste realizador.

Mas foi ontem que vi o documentário e apeteceu-me este assunto de paleio, antes que me esqueça do que vi e do que senti...

lunes, 28 de junio de 2010

A origem do Roquefort

Gostei do jeito como se despe o pretensiosismo gourmet em Estômago. Eu que salivo com Roquefort e não sabia que se trata de uma "imitação francesa foleira do Gorgonzola", foi sobretudo disso que gostei. (O facto de o filme ter sido co-produzido pelo Brasil e pela itália pode ajudar a explicar o "esclarecimento!)

Também gostei da forma como entrámos nas "famigeradas" prisões brasileiras, mas sem cair na tentação da comiseração. Neste filme não se lambem feridas, só pratos :)

China?

Afixaram a foto de um jovem no quadro da cantina da fábrica de aviões. Ela apreciou-o como todos e se no princípio não gostou que a acasalassem com ele, só porque a sua beleza condizia com a dele, de tanto olhar aquela foto começou a interiorizar a ideia. Especulava sobre quem seria e como seria e como seriam os dois...
Um dia foram todos chamados à cantina e um superior explicou-lhes que o rapaz da foto tinha vinte e poucos anos, pilotava aviões e perdeu a vida em serviço porque uma das peças falhara. Uma das peças que saíra daquela fábrica de aviões, porque alguém falhara... "Pensem nisso", ter-lhes-á dito o chefe!

Esta é uma das histórias que o filme - documentário 24 City conta. O realizador Jia Zhang Ke entrevistou antigos empregados de uma ex-fábrica de aviões chinesa, bem como alguns descendentes de antigos empregados, para nos mostrar um bocadinho da antiga China da segunda metade do século XX e da actual China. O filme é construído a partir das suas respostas. Um filme que nos deixa cheio de perguntas e com a suspeita de que a China está mais perto do que parece.

O pé esquerdo dele

Trabalha com as mãos e com os olhos, mas eu talvez não tivesse dado por ele se não fosse o que deixou de ser o seu pé esquerdo. Perdeu-o no ano passado numa explosão no Afeganistão, onde estava a trabalhar. Chama-se Emilio Morenatti, é espanhol e é fotojornalista da Associated Press.
Não sei se desistiu de nos contar como vivem os que vivem nos territórios em guerra, mas agora está a cobrir o Mundial, na África do Sul...

Esta foto soberba foi captada num momento em que estes sul-africanos assitiam ao Portugal - Brasil, na sexta-feira.
Na África do Sul como no Afeganistão, este fotojornalista interessa-se (parece-me) mais pelos efeitos colaterais, do que pela batalha em si... O que me agrada.

jueves, 17 de junio de 2010

Dignidade garantida, que a dignidade não é coisa mínima

A minha avó criou os filhos dela, os sobrinhos dela e os netos dela, nos mesmos anos em que trabalhou muito no campo e em casa. Antes disso tudo ajudou a mãe a vender peixe na Ribeira e trabalhou numa fábrica. Nunca fez descontos por conta própria, porque não podia, nem por conta de outrem, porque o patrão meteu ao bolso o dinheiro que supostamente seria para o Estado previdente do país salazarento, sonolento e desatento.

A minha avó, que durante anos contribuiu para um país melhor, não teve direito a reforma, nem a rendimento mínimo, até à morte do meu avô. Depois herdou a parte da reforma dele, que lhe cabia por viuvez.

Pois que há muita gente que recebe reforma e reformas a mais, face ao que produziram e face ao que contribuíram, mas há muitos também a receber reforma e subsídios sociais a menos face ao que produziram.
As donas de casa e mães a tempo inteiro, cujos maridos ganham pouco mais que o salário mínimo... As avós e os avôs que não contribuíram, mas não sabiam. E os que a falta de saúde não permite laborar... Por todos eles se justificam os subsídios sociais e a melhor forma de os defender é pôr a claro os seus teres e haveres.

Se defendo que quem tem bom corpinho deve trabalhar em vez de relaxar as peles à custa do Estado inconsequente, também sou a favor de que se acautelem os direitos de quem andou demasiado ocupado a trabalhar e não teve engenho para os acautelar.

O Governo não me perguntou nada - incompreensivelmente nunca me pergunta nada, à excepção daquela pergunta retórica que de quatro em quatro anos, às vezes menos, me vai fazendo - mas discutia-se o tema no Fórum de hoje da TSF e precisei de escrever isto.

martes, 15 de junio de 2010

Descontrolo e sonho

Apostei na Argentina e em Portugal. De acordo com as regras do meu clube (portugueses e espanhóis com quem trabalho) de apostas posso mudar de ideias, mas só até amanhã. Não mudarei.

Maradona está no pólo oposto ao do Mourinho, de quem sou fã sem reticências e sem "mas".
Maradona está de pé, contra as estatísticas, contra quase todas as apostas, contra a moral, contra o bom senso e contra muitas coisas de que eu sou a favor, mas ainda assim torço por ele, torço pelo seu poder de contrariar, pela capacidade de sonhar que ele inspira...

A menos de uma hora de entrarem no covil das vuvuzelas, os que vestem a nossa camisola estão a latejar, imagino...
Não somos todos iguais, mas para mim são esses os momentos que valem mais, como quando via e escutava os músicos da EPABI a afinarem os instrumentos mesmo antes de iniciar o concerto. Adorava aqueles sons, os gestos nervosos, o brilhozinho nos olhos... O mesmo brilho e os mesmos nervos que nos mantinham em frenesim antes de se abrir a cortina para a plateia negra e expectante...
Vale tudo mais quando nos sentimos assim: prestes a entrar em "campo" e a dar tudo por tudo para "pontuar"!

Agora mesmo, no meu cérebro, é como se ressoassem vuvuzelas!

PS: o melhor calendário do mundial

viernes, 11 de junio de 2010

Sôdade!

Mudámo-nos para o meu actual prédio quase na mesma altura. Além do andar que nos separa, a distância mais óbvia é a do tempo, o de vida vivida e, teoricamente, o de vida por viver.
Já há mais de um mês que não os via, nem a um, nem a outro, nem aos dois juntos, que é como os via mais vezes...
Hoje reencontrámo-nos. Depois de dobrar a curva do banco, vi-os a descer a rua, mais lentamente do que eu a subia. Devolvi-lhes o sorriso com que me descobriram... Como sempre, acrescentaram-me um diminutivo ao nome e a senhora quis dar-me um beijinho porque há muito que não nos cruzavamos...
Talvez por coincidirmos na altura em que ganhámos uma nova morada, a empatia foi imediata e nunca nos contentámos com um olá, bom dia! Esticamos sempre o paleio e hoje fiquei a saber que estiveram recentemente em Cabo Verde, de visita à neta, que "não é a jornalista, é a irmã" e que por lá era tudo "muito asseado e digno, apesar de haver ainda muita miséria". E não, "não é o caos que há-de ser Luanda!"

Depois de me despedir dos vizinhos, mantive-me por "Cabo Verde"... Fiquei a pensar que por lá está alguém que me inspira um sentimento parecido com o que provoca este casal... O JP. Não tive tempo de lhe conhecer nenhum defeito, mas tenho recordações de sobra para sentir muita "sôdade"!...
Aproveitei-me do talento dele e juntos ganhámos um concurso de dança, improvisado numa noite singular no bar da associação! O mesmo bar onde noutra noite nos mantivémos acordados (até partirmos bem cedo para uma digressão do Teatr'UBI na Galiza) graças às também improvisadas aulas de kuduro e funaná do JP!
Foi também meu cúmplice, juntamente com mais duas amigas, na tarefa de vasar todos os restos de Pedra do Urso que ainda sobravam nas mesas, no final de um jantar do curso de comunicação!
É especial este JP, o bastante para o irmos esperar ao comboio no dia em que fazia anos, com um bolo recheado de velinhas acesas, em cima de um carrinho de mão! Ia sufocando de emoção, de tão sem jeito que ficou!
Com ele aprendi a gostar de cachupa e sobretudo da festa que as reuniões de cachupa significavam! E a dizer Txuco! E que Txuco vai ser sempre = a JP!

miércoles, 9 de junio de 2010

Depois da tempestade...

Suspeito que choveu e ventou durante a noite... O suficiente para cobrir de florinhas algumas ruas da cidade, as que ainda parecem acusar algum planeamento passado, possuindo um corredor de árvores a sombrear os lugares de estacionamento e a separar os dois sentidos de rodagem.

Uma rua pintada de roxo, outra de cor de rosa, a praça do Saldanha de amarelo gema de ovo... E um perfume húmido a condizer no ar...

Gosto destes começos de dia, ainda molhados.

martes, 8 de junio de 2010

Es geht!

As imagens mostravam ratos e a voz-off estabelecia uma comparação entre ratos e judeus. Recordo-me destas imagens de um documentário que vi há uns anos sobre propaganda nazi...
Agora sabemos no que isso deu e agora é demasiado fácil recriminar o povo alemão por ter captado precisamente a mensagem pretendida pelo regime nazi. No caso, o facto de ser demasiado fácil, não torna a crítica menos legítima.
Há pouco tempo estranhava ouvir que é na Rússia que os skins se estão a propagar actualmente!
Também não deixa de ser insólito, irónico, que seja precisamente com a direita que os extremistas judeus são conotados! Hoje Hitler e os extremistas palestinianos estariam do mesmo lado da barricada?

Eu "estou" na Alemanha duas vezes por semana, nas aulas de alemão do Instituto Goethe.
A vantagem, quanto a mim, de aprender línguas numa escola como o Goethe (acontece o mesmo com o Cervantes) é que se aprende bastante sobre os alemães e sobre a Alemanha. Entender a língua de um povo tem que ser muito mais do que traduzir palavras. Descodificar o alemão é também descodificar os alemães. E aos poucos é isso que vamos fazendo... Ontem, por exemplo, numa aula diferente, conhecemos uma empresa que medeia negócios entre portugueses e alemães e ficámos a saber que aos alemães não lhes interessa os preliminares de apresentação, mas antes atalhar directamente para o que interessa ao negócio, pelo que uns e outros são aconselhados a abrandar ou acelerar, consoante a situação...
E na RTP 2 têm passado episódios de um documentário sobre a segunda guerra mundial, onde se contam os dois lados da história, onde se contextualizam, como eu ainda não tinha visto, os dois lados da história. Não se pretende desculpar nada nem ninguém, mas, parece-me, que as coisas são contadas com mais distanciamento, o distanciamento que só o passar do tempo autoriza...
Imagino que não seja fácil a nenhum alemão esgaravatar no passado, nem tão pouco facilitar a vida a outros que o queiram fazer, mas mesmo assim esta história está mais bem contada do que as versões que conheci antes... As ficcionadas e as dos livros de história.

Eu gosto dos alemães que conheço agora e não tenho como não respeitar a capacidade alemã de dar a volta por cima, bem como o rigor que aparentam...
Ontem falava-se dos cortes que a senhora Merkel quer impor, no país que ainda financia grande parte da Europa. Cortes que poupam a área da Educação, porque se pretende acautelar o futuro próximo, mas também o mais distante!

No último fim-de-semana lia no Expresso um artigo sobre o renascimento da revolta na Alemanha, com laivos xenófobos... Por que Europa estarão os alemães dispostos a sacrificar-se? Perceberão todos porquê? Seremos todos capazes de explicar as vantagens de uma Europa menos desequilibrada, mesmo aos que estão no prato mais generoso da balança ou cairemos na tentação de apontar o dedo aos que estão no prato mais fraco, ou aos que vêm de fora... Como o taxista que hoje se queixava dos brasileiros, como um todo, incriminando-os indiscriminadamente...

Acho agora demasiado fácil incendiar a mesquinhez porque fomos pouco educados para sermos grandiosos quando estamos pequeninos, ou quando nos sentimos ameaçados...

martes, 1 de junio de 2010

Goooolo!... do Telmo Martins

O que se faz quando se tem um filme para promover?
Aproveita-se a estadia das Selecção Nacional na Covilhã (que por acaso é a cidade que serve de cenário ao filme, em que também é personagem), oferece-se uma sessão para subtrair momentos de tédio aos jogadores e toca a pedir-lhes uma cunhazita! Grande jogada de marketing da equipa do Telmo Martins!


Jogadores bem cotados no mercado publicitário endossam simpaticamente o filme: apoiem o cinema português independente, vejam "Um funeral à chuva"!
O You Tube, o facebook, os bloggers e afins tratam do resto!