miércoles, 10 de diciembre de 2008

Quando uma chinesa te oferece um pente...

Quatro degraus acima do meu, nas escadas rolantes do Metro das Olaias, seguia uma chinesa de cabelo muito escuro e escorrido como quase todas as chinesas. Penteava-se com um pente cor de rosa, aparentemente de plástico.
Olha para trás, sorri-me e com um gesto pergunta-me se quero usar o pente dela?
Também lhe agradeci com um sorriso e acenei que não era preciso.
Mais do que ser surreal alguém me oferecer um pente no Metro, é estranho ter sido uma chinesa.

Conheço pouquíssimo dos chineses. Não tentei conhecê-los melhor, nem eles a mim. Sempre me pareceram propositadamente distantes. Só me relacionei com chineses comercialmente, nas lojas dos chineses e nos restaurantes chineses.
A excepção aconteceu há quase um ano quando descobri no Saldanha uma lojinha de chineses diferente. Chama-se Janela de Pequim. Dela trouxe um bocadinho da China para a minha sala, onde está uma chinesa a tocar flauta. A figura desenha-se recortada em papel de arroz preto por alguém que faz jus à expressão "paciência chinesa" e também ao baixo custo da mão-de-obra na China. A acreditar (e eu acredito) que aquela obra foi recortada manualmente, o preço que paguei, 20 euros, foi baixo...
Na Janela de Pequim há pedacinhos da China como o que pendurei na parede da minha sala. O simpático dono, Yaoqun Zhu, quer mostrar que a China é mais do que aquilo que sabemos...

Entrevistei-o para um artigo que foi publicado no OJE:

A China em Lisboa

Pouco mais conhecemos da cultura chinesa do que o sabor do chop soi. Yaoqun Zhu está empenhado em elevar a fasquia através da loja que abriu em Lisboa. Na “Janela de Pequim” podemos usufruir de uma visita guiada pelas tradições, artesanato e história da China, aprender a desenhar e a decifrar a caligrafia chinesa e exercitar a paciência e o bom senso numa partida de “go game”, o tradicional jogo de estratégia chinês…


O estereótipo da loja chinesa não encaixa na “Janela de Pequim”. Percebemos isso logo que espreitamos o espaço que Yaoqun Zhu inaugurou no Verão passado, na zona do Saldanha, em Lisboa. Pintura à mão em tinta-da-china sobre papel de arroz, bijutaria feita em lacre vermelho, esculturas em porcelana e bronze, entre outras peças de artesanato aguçam a curiosidade de quem passa na Avenida 5 de Outubro. Mesmo sem falar bem português, Yaoqun Zhu disponibiliza-se prontamente para explicar a origem de cada uma das peças que criteriosamente seleccionou para vender na “Janela de Pequim”. O objectivo é dar a conhecer melhor a China, explica: “Penso que os ocidentais, de uma forma geral, conhecem pouco e mal a China. A ideia que se tem da China é muito redutora. Através da minha loja pretendo mostrar vários pedacinhos da China, das suas tradições e cultura”.
A “Janela de Pequim”, ou “Beijing Zhi Chuang”, é a primeira experiência comercial de Yaoqun Zhu. Nascido em Pequim, viveu e trabalhou nos EUA, no Canadá, na Austrália, na ex-URSS, para “aprender in loco como vivem os diferentes povos”. Foi professor na China e trabalhou em turismo, o que lhe permitiu conhecer muito bem as diferentes regiões chinesas e os respectivos produtos locais. Meio caminho andado para abrir uma loja que funciona como montra da cultura chinesa, conta: “Tenho muito orgulho na cultura chinesa, que remonta há cinco mil anos. Não há outra civilização que se mantenha há tanto tempo. Ainda detectamos raízes e influências do início da nossa civilização.” Yaoqun Zhu exemplifica, enquanto folheia o “I Ching”, ou livro das Mutações, uma publicação que tem um valor semelhante à Biblia para os católicos: “O I Ching tem cerca de três mil anos e continua a influenciar a vida das pessoas. Mesmo que a maior parte dos chineses não o leia, é influenciado por ele. Por exemplo, no que se refere ao equilíbrio, baseado no princípio da dualidade de Yin Yang, presente na forma como nos alimentamos ou nos vestimos.”
Além do “I Ching”, podemos encontrar na loja livros sobre gastronomia, caligrafia, bem como edições sobre os mais relevantes filósofos chineses, como Tsun Zu ou Confúcio.
Enquanto nos mostra algumas esculturas em bronze, Yaoqun Zhu vai falando da história da China: “O bronze era usado há 2200 anos para fazer armas e instrumentos úteis. Na época estava no poder a dinastia Qin, nome do imperador que mandou erguer a grande Muralha da China.” Mesmo ao lado das esculturas em bronze estão expostas peças em porcelana chinesa, representativas de “um dos períodos mais ricos da história da China, o da dinastia Tang (618-907)”.
Yaoqun Zhu prossegue a visita guiada, mostrando-nos os típicos chapéus-de-chuva chineses, com armação de bambu. Julga-se que os chineses já os usavam há 2000 anos. Na altura seriam feitos de seda, material mais tarde substituído pelo papel de óleo, derivado de uma árvore autóctone chinesa. Sabe-se também que os chapéus funcionavam como elemento social distintivo: os vermelhos e amarelos só podiam ser usados pela família real, restando ao povo usar os azuis.
Também antigo é o teatro de sombras chinesas, tido como um dos percursores do cinema. Apareceu durante a dinastia Han 206 aC - 220 dC. Na loja de Lisboa também é possível adquirir algumas destas figuras e depois experimentar articulá-las atrás de um lençol iluminado.
Outro passatempo muito popular na china é o jogo, sendo o “go game” um dos mais conhecidos. É jogado num tabuleiro, onde se movimentam pequenas peças brancas e pretas. “Trata-se de um jogo de estratégia muito bom para exercitar o raciocínio matemático, a paciência e o bom senso”, explica Yaoqun Zhu. O tradicional “go game” joga-se a dois, mas Yaoqun inventou e patenteou um jogo semelhante para quatro jogadores. “Joga-se num tabuleiro maior e é bem mais complicado”, diz, acrescentando que quem quiser iniciar-se no “go game” tradicional pode fazê-lo na “Janela de Pequim”. Yaoqun prontifica-se a ensinar as regras e assim angariar potenciais parceiros de jogo.
Além da iniciação ao “go game”, na “Janela de Pequim” também há cursos de caligrafia chinesa, outro “exercício de paciência e de concentração”, frisa Yaoqun. Aprender um pouco mais sobre a cultura chinesa é uma experiência garantida a quem visitar a “Janela de Pequim”, com a vantagem de que pode levar um pouco da China para casa, se comprar uma escultura, um painel feito de meticulosos recortes, peças em pano alusivas ao zodíaco chinês, entre outros artefactos manualmente “made in China”.


“Janela de Pequim”
Av. 5 de Outubro, nº 20, loja 6
1050 – 056 Lisboa
E-mail: janeladepequim@sapo.pt

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