Verde. Verde por todo o lado.
Quase todos os verdes do mundo parecem ter marcado encontro por ali, àquela hora.
Escuta-se a água a cavar carreiros encosta abaixo e os pássaros que não identifico palrando indiferentes a mim.
Acordar assim deixa-me tonta... tanta pureza, tanta Natureza desordena-me o pensamento, como se tivesse bebido um balde de café.
Mesmo sem intenção, mesmo sem obedecer à ordem cerebral, começo a inspirar mais profundamente e dou-me conta disso e fico ainda mais tonta.
Como se perdesse o controlo... Tanta Natureza obriga-me a readaptar as minhas rotinas, mesmo as que não considero rotinas, e a questioná-las... a agir muito mais do que a pensar e eu sempre achei que preferia ao contrário, mas talvez assim seja mais libertador, mais compensador...
Fico desconfortavelmente comovida com o Benfica... persegue-me para todo o lado, pára quando paro e mira-me nos olhos, vence depressa a minha antipatia pelo nome que lhe deram, mendiga a minha companhia e agradece com um vagaroso movimento de pálpebras, se lhe afago o pêlo...
Conhecemo-nos há minutos e já somos cúmplices... Ele desconfia que não costumo estar muito à vontade com os da espécie dele, mas suspeita que eu não saberia resistir à meiguice de quem me segue sem se impor, de quem parece estar pronto a acompanhar-me só porque gosta de estar comigo...
Contaram-me a história deste Benfica: o dono, com quem dividia a casa, adoeceu de velhice e foi-se embora da aldeia. Foi para casa dos filhos em Lisboa e o Benfica não foi convidado... Ficou a guardar a casa na Malhada e vai comendo o que os poucos habitantes que como ele permanecem na aldeia lhe oferecem.
Parece triste o Benfica, ou sou eu que fico triste quando olho para ele. A Natureza já não o deixa tonto como me deixa a mim e parece importar-se pouco por estar rodeado de quase todos os verdes do mundo... Resiste numa aldeia camuflada pelo esquecimento dos que lá nasceram, dos que lá viveram e principalmente dos que, como eu, nunca a perceberam.
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