viernes, 24 de abril de 2009

Esquecerem-se da outra metade

Na véspera em que se assinala o dia que permitiu que os seguintes fossem dias de liberdade, apetece-me escrever sobre a que me autoriza a estar agora a teclar assim, sem freio... sem o freio externo, porque do nosso nunca nos livramos!
Isto porque ontem disse a mais um colega o que já disse a outros quando acreditava neles ou na vontade deles... Disse-lhe que se queria ser jornalista, não desistisse do jornalismo e senti o que já tinha sentido outras vezes: que o apunhalava pelas costas... porque só uma parte de mim acredita no que estava a dizer... a outra metade teme que insistir não seja suficiente... porque conheço mais finais infelizes do que permanências felizes no jornalismo...

Temos Liberdade e até temos a liberdade de não saber arcar com as consequências da Liberdade e essa já é talvez liberdade a mais. Ou talvez nos falte interiorizar que a Liberdade pesa mais sobre as nossas costas do que a sua ausência. Esqueceram-se de conquistar metade da Liberdade, esqueceram-se da responsabilidade que a dignifica.

E no jornalismo essa metade está escancaradamente ausente. Temos agora mais órgãos de comunicação, temos blogues, temos por onde escolher... Mas temos também muito do mesmo. Temos redacções mal geridas e jornalistas sem pingo de criatividade e/ou de ética. Incompetência paga a peso de ouro (incompetência remunerada é sempre demasiado bem paga)! Temos gente dessa em trânsito de redacção em redacção a minar a vontade de quem quer fazer melhor, de quem sabe fazer diferente, de quem um dia deixa de insistir, a quem desarmam... E é quase sempre nesses incompetentes do costume que apostam os investidores (incompetentes) do costume...
Há uns anos fui a uma entrevista no Jornal de Negócios... Não tinham lido um texto meu, nem me pediram para ler. Perguntaram-me pela minha agenda de contactos na área de energia e sobre o meu currículo. Era-lhes indiferente, aparentemente, o meu eventual talento, as minhas motivações para estar na profissão, as propostas de temas a explorar. De mim não queriam nada de novo, queriam pouco de mim, queriam que fizesse provavelmente umas quantas chamadas por dia e escrevesse a partir delas... porque dessas caixas preguiçosas vivem ainda muitas páginas de jornais, resolvem o dia de escrivas de quem não sai uma ideia de notícia, nem uma abordagem diferente, nem um raciocínio capaz de ir buscar a notícia ao miolo de uma conversa de café, à passagem de um livro, ao detalhe camuflado pelo protagonismo da actualidade... Os que babam pelo press release e pelos segredos (estrategicamente libertados) em conversas de bastidores estão pouco empenhados em empregar ou gerir alguém que ouse propor, raciocinar sobre outras possibilidades, sem estar refém da actualidade e da sacro-santa agendinha de contactos...
Essa é a tal responsabilidade do jornalismo, a de não ir só pelo caminho mais óbvio. A de contar outras verdades, outras histórias, de gerar outros interesses, de alargar as vistas do receptor, de o fazer questionar, despertar-lhe outras curiosidades. Essa responsabilidade de que a liberdade também é feita está em esquecimento ou em progressiva letargia.

"i" num instante tudo muda? http://www.inuminstantetudomuda.com/#/home
Espero que mude mesmo, espero que melhore! Aguardo por esse novo projecto jornalístico "i" com essa expectativa!
Numa interessante e para mim reveladora entrevista que Emídio Rangel deu esta semana à Antena 1, recordou outro instante em que muita coisa mudou, o instante em que nasceu a TSF. Para mim ainda o melhor órgão de informação em exercício em Portugal. Também o aparecimento da SIC mudou muita coisa na informação, como também recordou Rangel, acabando com a hegemonia do ângulo estatal que a RTP daquele tempo privilegiava... mas disso eu não me lembro... tinha pouca maturidade jornalística na época e ainda menos consciência política. Mas gostei de saber que antes da TSF se tinha que agendar com os deputados da Assembleia da República o dia em que eles responderiam à pergunta e que com a TSF a actualidade ganhou uma definição mais fiel a si própria e os deputados uma nova "destreza mental", capaz de reagir ao directo, em directo!
A inteligente estratégia de promoção do "i" é também inquietante! "i" num estante muda tudo!

PS: Há uns dias escrevia que ainda não sabia o que fazer com isto, com este blogue hermafrodita, entalado entre um quase jornal e um quase confessionário de tom moralista ou redentor. Continuo a não saber e a sentir-me desconfortável com isso... porque dizer a verdade é uma coisa. No instante seguinte, já passou! Mas escrever a verdade é bem diferente. A escrita grava como num fóssil o pensamento, mesmo quando até o autor já não pensa mais o mesmo.

1 comentario:

MaB dijo...

O empenho e o entusiasmo...posso dizer-te eu, que tenho vivido o projecto...são grandes, enormes, gigantes. Há muito sonho, muita vontade de fazer mais e melhor! Sinto-me uma privilegiada por fazer parte de um projecto que se identifica com a diferença e faz dela bandeira. Por um bom jornalismo e pelo saudável exercício da liberdade. Beijos